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À CONVERSA COM... CASA AGRÍCOLA JOSÉ ALBINO FERNANDES
À CONVERSA COM... CASA AGRÍCOLA JOSÉ ALBINO FERNANDES
18 de Maio de 2021

A um mês de mais uma Feira de S. João na Ilha Terceira, fomos conhecer um pouco melhor como se trabalham os toiros

Em 1967 foi fundada a Casa Agrícola José Albino Fernandes que tem, à presente data, como representantes Maria de Fátima Ferreira e António Manuel Ferreira com quem tivemos o prazer de estar à conversa.

Desde já agradecemos toda a amabilidade e simpatia com que sempre nos receberam.

 

FT – A Ganadaria Casa Agrícola José Albino Fernandes foi fundada em que ano e quais são as suas origens?

CAJAF - A Casa Agrícola José Albino Fernandes foi fundada em outubro de 1967, iniciou-se com gado da terra dos ganaderos terceirenses Virgílio Barcelos e gado da antiga ganadaria Tomaz de Borba, e gado adquirido no Continente aos ganadeiros António Antunes Barbeiro e Plácido de Boavista, e um toiro que pertencia a António Lampreia, o nº 242. Em outubro de 1971 foram adquiridos os animais da antiga ganadaria de José Diniz Fernandes, que pertencia na altura ao Manuel Almeida Jr e em novembro de 1971 comprou a ganadaria de Castro Parreira. Em 1995 adquiriu-se vacas e um novilho à ganadaria Ortigão Costa e em 1998 a compra de mais dois sementais. Em 2001 procedeu-se à compra da ganadaria de José Eduardo Fernandes Silva, da linha Brito Paes e a partir de 2009 adquiriu-se as primeiras novilhas e um semental ao ganadeiro Carlos Falé Filipe, de encaste Domecq, em 2010 procedeu-se a nova aquisição de novilhas e um novilho, em maio de 2013 um semental, em abril de 2015 outro semental e em agosto de 2016 mais novilhas. Em setembro 2019 a ganadaria faz a sua última aquisição até ao momento, à ganadaria Santiago Domecq de vacas e um semental.

FT – Quando é que a ganadaria passou a ser propriedade da D. Maria de Fátima Soares Fernandes Rocha Ferreira e qual o papel desempenhado, atualmente, pela D. Maria de Fátima e pelo seu marido, António Manuel da Rocha Ferreira?

CAJAF - Quando faleceu o meu pai, José Albino Fernandes, a 20 de abril de 1994 e a minha mãe, Maria Alvarina Soares Fernandes, a 11 de julho de 1994, eu como a única herdeira, e o meu marido, António Ferreira, passamos a proprietários da ganadaria.

FT – Como foi visto o facto de a administração da ganadaria passar para a alçada de uma mulher?

CAJAF - Como filha única, sempre tive um papel muito ativo na ganadaria do meu pai, ajudando e colaborando na ganadaria, por isso toda a Ilha Terceira sabia e aceitou com naturalidade que seria a proprietária e que tinha muito afición e vontade de o legado familiar continuar e que também sempre tive o apoio do seu marido na gestão e maneio da ganadaria.

FT – Quantas pessoas têm na manutenção da ganadaria e qual o papel de cada uma? Todas elas fizeram parte da sua fundação?

CAJAF - Atualmente, a tempo inteiro na ganadaria apenas temos o proprietário, António Ferreira e o empregado, Carlos Tomás. Mas a ganadaria conta também com a colaboração de pastores, aficionados, familiares e amigos de várias gerações, que permitem que o seu maneio se faça com a sua gratuita colaboração.

FT – Como tem decorrido a evolução da ganadaria? Quais os maiores progressos desde a sua fundação?

CAJAF -  ganadaria tem exigido um grande esforço na aquisição de terrenos e na construção e manutenção de infraestruturas que têm permitido um maneio coordenado e seguro. E uma grande evolução a nível genético, tendo se melhorado as duas linhas existentes, uma para as touradas à corda e outra para as touradas de praça. Para a linha da tourada de praça, esta teve, por ordem cronológica, um grande investimento na aquisição de animais de Ortigão Costa, José Eduardo Fernandes Silva (linha Brito Paes), Carlos Falé Filipe e Santiago Domecq. Na tourada à corda, o grande desafio é fazer perdurar a genética das ganadarias antigas que fundaram esta ganadaria, pois é um circuito fechado sem introdução de novos encastes. Podendo-se afirmar que atualmente para a tourada à corda a ganadaria possui um encaste próprio e para a tourada de praça um encaste domecq.

FT – Qual a origem das vacas e sementais “fundadores” da ganadaria?

CAJAF - A origem da ganadaria foi em gado da terra com características para a tourada à corda, que ao longo dos anos deram toiros para a tourada à corda e para a tourada de praça. Como referido anteriormente, tiveram origem nos ganaderos terceirenses Virgílio Barcelos, Tomaz de Borba, José Diniz Fernandes e José Castro Parreira e ainda do Continente, nos ganaderos António Antunes Barbeiro, Plácido de Boavista e António Lampreia.

Mas com as exigências do novo toureio a pé e a cavalo, que exigia toiros puros e com características especificas de apresentação, de investida, recorrido e nobreza, houve necessidade de manter duas linhas. Hoje mantemos duas linhas totalmente separadas.

FT – O que é um semental e o que são as vacas de ventre? Quantos / Quantas cá têm?

CAJAF - Um semental é um toiro que é escolhido pelo ganadero para cobrir as suas vacas, oriundo de uma linhagem, que se pretende que seja o garante de qualidade, mas que por vezes não resulta e poderá trazer dissabores. As vacas de ventre são as mães, as peças mais importantes que mantêm uma ganadaria com qualidade e que faz perdurar o património genético de uma ganadaria. Temos 4 sementais para a linha da Tourada à Corda e 5 sementais para a linha da Tourada de Praça. E temos à volta de 70 vacas da “linha da terra” (tourada à corda) e cerca de 70 vacas de lide.

FT – O que são vacas de chocalho?

CAJAF - São as vacas que ajudam a encaminhar os toiros de pastagem em pastagem ou que os retiram da arena da Praça quando são recolhidos. São auxiliares de uma boa condução de gado bravo.

FT – Qual a designação ou denominação das reses nas várias etapas etárias, desde que nascem até á idade de serem lidadas ou de padrearem no campo?

CAJAF - As rezes bravas têm diversas nomeações, dependendo da idade. Tais como:

Com 1 ano de idade chama-se bezerro/bezerra;

Com 2 anos de idade tem o nome de garraio/garraia;

Com 3 anos de idade dá-se o nome de novilho/novilha;

Com 4 anos de idade tem o nome de toiro bravo/vaca brava.

Considera-se que um Toiro Bravo atinge a idade adulta ao cumprir 4 anos de idade. E uma Vaca passa a ser uma Vaca Brava de Ventre quando tem a sua primeira cria.

FT – De que forma avalia a bravura das vacas e quais os critérios utilizados?

CAJAF - A avaliação das vacas é feita normalmente quando são garraias (tem cerca de 2 anos) e baseia-se nas tentas. As vacas da linha de lide são tentadas com picador e toureiros, enquanto que as vacas da “linha da terra”, as tentas são com os nossos “capinhas” da Tourada à Corda. Os critérios avaliados são: prontidão, mobilidade, codícia, capacidade de fixação, resistência, colocação da cabeça na investida (o humilhar), recorrido e evolução do seu comportamento na lide.  

FT – Tem alguma altura específica para ser realizada e quem a efetua?

CAJAF - Normalmente, as tentas das vacas da linha de lide são efetuadas quando temos artistas/toureiros na ilha, que pode ser, pelas Sanjoaninas ou Festas da Praia ou nos ciclos de Tentas Comentadas enquanto que as tentas das vacas da “linha da terra” acontecem antes do início das Touradas à Corda, por isso antes do dia 1 de maio. Contribuindo também, para a preparação dos “Capinhas”, os grandes animadores das Touradas à Corda.

FT – Qual o destino das vacas após essa avaliação?

CAJAF - As vacas aprovadas e selecionadas, serão as futuras mães e a continuação do património genético. As que são reprovadas podem ser encaminhadas para o matadouro ou podem ser utilizadas para as festas no tentadeiro, a quando da ida ao Mato pelas pessoas das freguesias antes das Touradas à Corda.

FT – O que considera necessário numa vaca para que possa vir a ser uma boa mãe?

CAJAF - Uma vaca aprovada para futura mãe de toiros de lide, tem de ser nobre, ter recorrido, fiereza, repetir, investir com durabilidade, em suma tem que ser brava.

Numa vaca para ser mãe de toiros para Tourada à Corda é importante que invista e repita constantemente, tenha muita resistência, tenha codícia, se fixe e persiga o capinha até este desaparecer, ou seja, que tenha também muita bravura.

FT – No que consiste a alimentação dos vossos animais e quais os maiores cuidados de saúde que têm com eles?

CAJAF - Os nossos animais comem pastagem, erva ensilada, palha e rações. Têm ainda suplementos vitamínicos consoante as necessidades e as idades. São desparasitados duas vezes ao ano, por norma, na primavera e outono e acompanhados regularmente pelo médico veterinário.

FT – Qual o significado das tentas e a sua importância para a vossa ganadaria?

CAJAF - As tentas são a seleção e a garantia que os animais têm comportamentos que nos agradam e vão de encontro aos objetivos para a ganadaria. E são obviamente de extrema importância, pois vão permitir a continuidade da ganadaria

FT – Qual o papel do Picador?

CAJAF - Pode-se dizer que a vara é o termómetro/barómetro que nos ajuda a descobrir a bravura, que retira a euforia aos animais e faz com que o seu comportamento e investida seja constante e não confunda o ganadeiro da sua qualidade. Daí que o picador tenha muita importância numa tenta, pois a sua execução irá ajudar a selecionar os animais.

FT – A ganadaria tem vindo a participar no Ciclo de Tentas Comentadas da ilha. Como tem sido o saldo dessas tentas?

CAJAF - A ganadaria tem participado sempre que possível no ciclo de tentas comentadas e também ajudado na organização, pois estas têm sido uma mais valia para a ganadaria. Ao longo dos anos tem tido bons resultados e selecionando boas vacas de ventre, já com filhos de boa nota. 

FT – Qual a sua opinião sobre a realização do Ciclo de Tentas Comentadas? Alguma coisa deveria ser alterada?

CAJAF - O Ciclo de Tentas Comentadas é um modo de divulgar a festa e instruir o público tornando-o cada vez mais conhecedor e apreciador da arte de bem tourear.

E sendo o terceirense um aficionado do Toiro Bravo, é uma grande oportunidade para estes poderem acompanhar a seleção que é feita nas ganadarias e o futuro destas escolhas.

Neste evento, o que se pede e se tem tentado corresponder é ter artistas à altura dos animais atuais na ilha e um comentador que chegue ao público e consiga transmitir todo o seu saber tauromáquico.

FT – O Forcadilhas e Toiros teve a oportunidade de assistir à participação de familiares nas Tentas do ano 2019. Isto significa que a ganadaria tem continuidade na família? As Filhas iram seguir os passos dos pais?

CAJAF - As filhas têm a paixão que é essencial para dar continuidade à Ganadaria, o futuro está bem entregue à família, mas estamos apreensivos com os tempos modernos, onde a realidade é escondida e os lóbis e fanatismos querem ditar as regras como se fossem iluminados, desconsiderando as tradições e não respeitando as diferenças.

FT – Consideram importante a presença de matadores espanhóis nas tentas e nas corridas, aqui na ilha?

CAJAF - Consideramos acima de tudo, muito importante a presença de bons toureiros, sejam eles de que nacionalidade forem. Pois, irá ter muito influencia no espetáculo que se assiste e na seleção feita pelo ganadero.

FT – A ganadaria tem toiros para toureio a cavalo, toureio a pé e para a tourada à corda? Como selecionam os animais para cada tipo de toureio?

CAJAF - Como já referido, a ganadaria tem duas linhas distintas. Uma para a tourada à corda e outra para a tourada de praça. Depois fazemos uma seleção separada através das tentas, como referido, se for para tourada à corda é com os nossos “capinhas”, se for para tourada de praça é com picadores e matadores de toiros. Depois a seleção é feita com base nos critérios já referidos, que terão importância e ponderação diferentes consoante o espetáculo a que se destina o animal.

FT – Quais as características que um toiro deve ter para ser considerado um bom toiro de lide?

CAJAF - No caso de um bom toiro de lide, este deve ter nobreza, ter recorrido, alegria na investida, fiereza, repetir e claro o fundamental é sempre ser um toiro bravo.

FT – Em que ano participaram, pela primeira vez, numa tourada à corda e numa corrida de toiros? Qual o resultado?

CAJAF - Desde 1968, o meu pai, José Albino Fernandes participou em touradas à Corda e na Praça e os resultados foram sempre com muitos sucessos. O maior resultado que podemos ter, é ainda hoje a ganadaria continuar a ser considerada pela sua qualidade ao longo dos anos.

FT – Já algum toiro após ser lidado, foi tratado e aproveitado como semental?

CAJAF - Nesta ganadaria, felizmente são vários os toiros que já foram tratados após a lide e passaram a ser sementais. Alguns exemplos mais recentes desta situação são: o toiro número 54, da linha de Ortigão Costa, foi toureado pelo matador “El Tato” na Praça de Toiros Ilha Terceira. O toiro número 41, que ganhou o prémio de Melhor Toiro Lidado a Cavalo nas Sanjoaninas e foi lidado pelo cavaleiro Rui Salvador, com volta à praça do ganadero. O toiro número 32, da linha de Carlos Falé Filipe, que foi toureado por Manuel Escriban na Praça de Toiros da Ilha Terceira. Na Feira de São João nas Sanjoaninas, o toiro número 214, que ganhou o prémio de Melhor Toiro a Pé e foi toureado por “El Cid”. O toiro número 34, que no Ciclo de Tentas Comentadas foi tentado pelo Alberto Lamellas, entre outros.

FT – Marcar presença nas corridas de S. João, que fazem parte de uma das festas mais importantes da ilha, as Sanjoaninas, dá por certo mais reconhecimento e prestígio à ganadaria. De que forma estes se manifestam?

CAJAF - Sem dúvida que estar presente nas Sanjoaninas é prestigiante e leva à Praça os adeptos da Ganadaria, tornando-a cada vez mais conhecida e querida dos nossos emigrantes e aficionados em geral.

FT – Todos os anos conseguem utilizar a camada existente?

CAJAF - Todos os anos fazemos por utilizar toda a camada existente, o que por norma acontece.

FT – Recentemente a ganadaria adquiriu algumas rezes bravas à ganadaria espanhola Santiago Domecq. Podem contar-nos como se proporcionou essa aquisição, que animais adquiriram e com que fim?

CAJAF - Como também somos aficionados ao toureio apeado, e gostaríamos de expandir o nosso efetivo nessa direção, por felicidade surgiu uma hipótese de adquirir gado a esta prestigiada ganadaria, por isso trouxemos 32 vacas, com algumas crias e um semental que tinha sido indultado em 2018, quando foi toureado por Pepín Liria na Praça de Toiros de Abarán, na província de Murcia, tendo sido o último toiro da carreira de Pepín Liria.

FT – É usual deslocarem-se a feiras, por exemplo a Espanha, na busca de algum tipo de toiro para a ganadaria?

CAJAF - As nossas deslocações a feiras sejam estas em Portugal continental ou em Espanha ou em França, são usualmente enquanto aficionados, não é comum irmos a estes locais escolher toiros.

FT – Pretendem fazer cruzamento do semental com vacas da casa ou das novas vacas com sementais da própria ganadaria?

CAJAF - Não faz parte do nosso objetivo cruzar linhas dentro da nossa ganadaria.

FT - No percurso da ganadaria, contam com toda a certeza vários prémios. Algum deles com significado especial?

CAJAF - Temos tido ao longo dos anos vários prémios, todos eles com grande significado por serem a mostra de um trabalho sério e dedicado, tando nas touradas à corda como nas touras de praça. No site da ganadaria, www.ganadariajosealbinofernandes.com, podem testemunhar estes acontecimentos e também no livro “Ganadaria da Ilha Terceira - Casa Agrícola José Albino Fernandes”, da autoria de Isabel Coelho da Silva, lançado em 2011, estão relatados muitos destes acontecimentos. Sendo, o site e o livro, formas de eternizar e agradecer os prémios recebidos.  

FT – Existe algum toiro que se tenha sobressaído e que fique na história da ganadaria?

CAJAF - Ao longo da história da ganadaria existem toiros muito importantes, que marcaram esta ganadaria e a história da tauromaquia terceirense. Sobressaindo alguns toiros na Tourada à Corda, como o número 38, conhecido pelo “Elisa” que deu 71 cordas, foi a muitas das freguesias da Ilha Terceira, e pegou em muitas pessoas, pois tinha como uma característica marcante, a corrida veloz que quando se fixava numa pessoa apanhava-a com muita facilidade, sem dúvida é um toiro que fez história na ilha Terceira.

FT – Praticam a sua atividade apenas na ilha ou também fora dela? Onde?

CAJAF - A nossa atividade é maioritariamente na ilha Terceira. Raras foram as vezes que nos deslocamos, mas já fomos com toiros para touradas à corda, na ilha Graciosa, na ilha de São Miguel, na ilha de Santa Maria, e no continente fomos a Alandroal e a Azambuja. Também marcamos presença na Ovibeja, mas não levámos toiros, fomos só com os pastores e capinhas da Ilha Terceira, para demonstrar a nossa tradição.

FT – A ganadaria recebe visitantes?

CAJAF - A ganadaria já alguns anos que tem recebido visitantes de toda a parte do mundo, com diferentes propósitos. Sejam para fazer documentários, entrevistas, turismo de laser ou taurino, visitas de estudo educacionais, entre outras. A ganadaria já há algum tempo que está preparada para receber visitantes e tem o feito, de forma pontual e sempre que solicitado.

FT – Apesar deste ano atípico devido à pandemia causada pelo COVID-19, a ganadaria ainda marcou presença na corrida das Festas da Praia e nos dois Festivais de Beneficência realizados na Praça de Toiros da Ilha. Qual o significado destas presenças?

CAJAF - Foram momentos onde o grande objetivo foi manter a Festa Brava ativa na ilha Terceira, num ano sem mais nenhuma atividade tauromáquica.

FT – De que forma foi a ganadaria afetada por esta pandemia? Quais as maiores dificuldades sentidas na manutenção da ganadaria? Existiu algum tipo de apoio para fazer face a essas dificuldades?

CAJAF - A ganadaria Casa Agrícola José Albino Fernandes tem cerca de 500 cabeças de gado que tem um custo grande na sua manutenção. Com o ano de 2020 sem touradas à corda e com um pequeno número de eventos tauromáquicos de praça, a faturação foi residual. Por isso, recebemos em 2020 um apoio do Governo Regional dos Açores e das Câmaras Municipais da ilha Terceira, tendo em conta a quantidade de touradas que tínhamos dado em 2019, mas a nossa atividade necessita é de touradas e satisfazer os nossos clientes e adeptos. De podermos apreciar o comportamento dos nossos toiros, de planearmos novas etapas, de gerirmos a nossa atividade com a criatividade e a paixão que nos tem acompanhado ao longo dos anos.

Para já, a ganadaria teve de ir reduzindo algum efetivo, essencialmente toiros, para tentar minimizar este desequilibro que a pandemia nos veio causar.  

FT – Como tem sido a “vida” da ganadaria durante esta fase? Têm efetuado alguma atividade diferente de outros anos em que tinham a tourada à corda e várias corridas de praça?

CAJAF - A vida da ganadaria no campo tem sido igual, uma vez que, temos procedido à manutenção das infraestruturas, temos efetuado a desparasitação dos animais, temos tido o controlo que é habitual ocorrer nas ganadarias, ou seja, temos tido todas as despesas que a ganadaria costumava ter, mas não temos tido a faturação como era habitual. Daí o grande desequilíbrio verificado, sem qualquer outra atividade para compensar, nesta fase de pandemia. 

FT – Para além de ganadeira, a D. Maria de Fátima teve até ao presente ano um papel de alguma importância no meio político. Quer dizer-nos de que forma e se essa posição influenciou de alguma maneira, quer positiva ou negativamente, a vida da ganadaria ou da tauromaquia da ilha?

CAJAF - Ao ser convidada para essa função, dei o meu melhor, mas sofri os reveses de ser criadora de gado bravo pelas pessoas que desconhecem a nossa atividade e não a querem conhecer, porque é mais fácil criticar os outros que respeitam a tradição e o empenho, que neste caso tanto o meu avô como o meu pai imprimiram à criação de uma ganadaria, ao difícil que é mantê-la com a qualidade que ficou na história dos meus antepassados e enfrentar uma filosofia de lóbis, ditadores, que se consideram superiores por terem modos de pensar que são moda. O que mais me entristece são os conceitos desgarrados da realidade que nos querem fazer acreditar possuírem.

O principal contributo neste mandato foi conseguirmos fazer alterações no decreto legislativo da tourada à corda que veio melhorar o seu funcionamento. E relembrar na assembleia legislativa que a Tauromaquia faz parte da nossa génese e permite definirmo-nos como povo, sendo umas das mais ancestrais culturas dos Açores.

FT – Para além de ganadeira e deputada, a D. Maria de Fátima é esposa, mãe e professora de profissão. Como consegue conciliar todas estas facetas? Qual destes “papéis” lhe dá mais trabalho e qual o que lhe dá mais prazer?

CAJAF - Ao longo da minha vida tentei sempre desempenhar o melhor possível as diversas tarefas, que cada atividade exigiu e a função de deputada foi o meu fim de carreira, foi uma experiência inesquecível, mas muito exigente. Ser deputada é uma atividade desconhecida da maioria da população, geradora de inveja irreal, com um espírito de serviço incalculável, muito exigente, mas muito criticada.

A família é o meu maior projeto, a ganadaria a minha paixão, o ser aficionada e defender a tauromaquia e a Ilha Terceira sempre foi o meu propósito. Ser professora foi uma realização muito importante, saber que junto das crianças lhes abrimos horizontes, contribuímos para a sua formação, é um sentimento de realização interior digno de um ser humano cauteloso e apaixonado pelo amanhã. Ser bancária, foi um prestígio, pois servir a população cumprindo com a arte de bem atender é inesquecível. Viver e procurar com fé uma vida digna sempre foi o meu lema. Agora tenho mais uma faceta que me deixa realizada, a de avó, o que já me sentia muito bem como esposa, mãe e cidadã terceirense sempre interessada na promoção da minha Ilha Terceira e dos Açores.

FT – Qual a visão que a D. Fátima e o Sr. António têm sobre o futuro da tauromaquia em Portugal e em particular na Ilha Terceira?

CAJAF - Em Portugal, temos que continuar a lutar e a apresentar novas ideias, para preservar a Tauromaquia e o Toiro Bravo. Na Ilha Terceira a Tourada à Corda é que torna cada vez mais apelativa a manutenção da ganadaria. A Tourada de Praça tem cada vez mais de se adaptar à nossa dimensão.

FT – Projetos futuros, individuais e para a Ganadaria?

CAJAF - Ver crescer ao nossos netos, as nossas filhas a assumirem a ganadaria e a continuar a pôr à prova dos aficionados da Terceira e de Portugal, os produtos criados por esta Casa Agrícola José Albino Fernandes.

NUMA PALAVRA:

Um ganadeiro?

José Albino Fernandes

Um toiro?

54 (da linha Ortigão Costa)

Um picador?

Simão Neves

Um toureiro?

El Juli

Um bandarilheiro?

António Badajoz

Uma praça?

Real Mestrança de Sevilha

Um cavalo?

Sopa de Leite

Uma praça?

Monumental da Ilha Terceira

Uma ganadaria?

Casa Agrícola José Albino Fernandes

Um matador?

Henrique Ponce

 Um forcado?

João Hermínio, do Grupo de Forcados Amadores da Tertúlia Tauromáquica Terceirense

Um cavaleiro?

Luís Miguel da Veiga

Corrida ou corda?

Ambas

Um filme?

Música no coração.

Um país?

Portugal

Uma cidade?

Angra do Heroísmo

Praia ou campo?

Ambas

Um destino de férias?

Itália

Um clube?

Benfica

Comida favorita?

Abrótea frita com molho de marisco.

Um sonho?

Ter uma corrida toda a pé em Espanha.

FT – Uma palavra/sugestão para o Forcadilhas e Toiros.

CAJAF - Bem hajam por serem aficionados! Agradecemos o Vosso empenhamento na promoção da Festa Brava, neste momento em que no Mundo se defendem exageros e não se respeita a tradição, os valores de cada um e se menospreza o amor e a dedicação de gerações à Festa dos Toiros. Agradecemos a oportunidade de darem a conhecer a afición dos Terceirenses, de elegerem a nossa ganadaria para que se saiba o que fazemos pela qualidade dos nossos toiros, respeitando o amor à tradicional Tourada à Corda e a paixão à Tourada de Praça. Somos um povo dedicado à tauromaquia, que ama em especial o Toiro, a sua imponência, a sua bravura, os seus feitos, porque os toiros da Tourada à Corda têm história. Felicidades, bom trabalho e muito sucesso. O nosso sincero obrigado.

Entrevista e fotos: CÉLIA DOROANA / ARMANDO ALVES / ANTÓNIO VALINHO